terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Barco preso



De algum modo Álvares tentava relaxar a cabeça. Talvez o mais conveniente fosse ficar em sua casa se embebedando de vinho barato e ouvindo músicas em espanhol. Mas como Álvares queria sentir outros ares em seus pulmões e viajar de barco, ele resolveu embarcar para a Ilha do Marajó.

A noite estava limpa e o rio calmo. Seria uma boa viagem se a lancha da Capitania dos Portos não resolvesse prender a embarcação. E Álvares já embocava a sua segunda latinha de cerveja no bar do barco e observava Belém com seus “espigões” de concreto do meio da baía de Guajará.

E o barco retornava para o porto escoltado pela a moderna lancha da Capitania.

Uma hora se passa e os oficias da Marinha negociam a liberação da embarcação, que ia com excesso de passageiro. Mas o proprietário está disposto a não liberar a grana aos oficiais. Uma embarcação do porto mais adiante também havia sido presa pelo mesmo motivo, no entanto era observável ela se distanciar no rumo de Cametá.

Um bar está funcionando no porto, então Álvares senti desejo de ir tomar umas cervejas lá, dado que as cervejas no bar do barco eram bem mais caras que as de terra firme.

- Cara, se eu tivesse certeza que esta porra fosse demorar mais um pouco encostada aqui – disse ele para um jovem que bebia uma latinha ao seu lado – eu ia tomar umas geladas ali naquele bar.

- Será que dava tempo? – retrucou o jovem.

- Não sei. Eu acho que o dono do barco não vai querer liberar o da “merenda” dos homens.

E assim a conversa fluiu naturalmente entre ambos. Era como se eles se conhecessem de longas datas. Um bêbado conhece o outro, dizem por aí.

- Pega uma latinha ali no isopor pra ti – disse o jovem a Álvares.

Álvares foi até uma sacola, abriu o isopor e tirou uma latinha.

- Tu andas prevenido – comentou Álvares abrindo sua cerveja.

- As cervejas aqui dentro do barco além de serem quentes demais, são caras demais.

- Isso aí é verdade.

E assim o tempo passava e nada da embarcação ser liberada. As cervejas do jovem acabaram-se. Ainda havia gelo dentro do isopor. Gelo suficiente para se gelar uma embalagem de cerveja.

- Vamos comprar mais uma embalagem? – sugeriu Álvares, que até aquele momento não sabia o nome do rapaz. E pelo visto não se importava em saber.

- Vamos! Bem ali fora do porto são quinze reais.

E assim eles interaram.

- Deixa que eu vou correndo lá – disse o rapaz.

E desse modo, o jovem foi correndo comprar as cervejas. Depois regressou e embarcou. As latinhas foram postas dentro do isopor e eles seguiram conversando até as latinhas gelarem.

A lancha da Capitania dos Portos se vai lá por voltas das 23h00min, e deixa a embarcação detida. Um barco se prepara para viajar para Macapá.

- Espera um instante – disse o jovem. – Eu vou ver se aquele barco pode parar em Boa Vista. Qualquer coisa tu desamarra minha rede e me dá lá fora.

- Tudo bem.

E assim o rapaz desembarcou e foi até o barco.

Álvares bebia as cervejas recém-geladas quando o jovem voltou todo afobado, pois o barco que ia para Macapá já se preparava para zarpar. Álvares desamarra a rede do jovem e pergunta para ele se ainda pode embarcar mais alguém naquela embarcação. O jovem pediu para ele aguardar um momento que ele iria conversar com o comandante.

- Mas desamarra logo tua rede e arruma a tuas coisas – alertou ele.

- Eu vou ficar aqui nesse mesmo lugar, esperando o teu sinal.

- Ok então.

E ele foi até o comandante. Falou que ele e o seu primo, nesse caso Álvares, precisavam viajar naquele dia para poder chegar a tempo de um velório.

- Tu falas que é só um – falou-lhe o comandante – mas quando acaba vem cinco a mais.

- Não! – reagiu o jovem. – Eu garanto que só é ele. Se embarcar alguém mais além dele, eu pago a passagem de cada um em dobro!

- Tudo bem, manda ele embarcar.

Desse modo o rapaz fez sinal de positivo de dentro da embarcação para o outro que estava dentro da embarcação detida. Então Álvares correu até o isopor de latinhas, pegou duas e deixou o resto. Depois desamarrou sua rede, pegou sua sacola e desembarcou as carreiras no rumo do barco que já dava sinais de partida.

- Olha as crianças aqui! Cuidado!

- Desculpe, senhor!

Álvares atravessou a rampa, ganhou as tábuas do trapiche e correu até o barco. Jogou suas bagagens para dentro da embarcação e embarcou suado.

- Tu trouxeste o isopor? – perguntou o rapaz assim que Álvares o encontrou.

- Não deu. Minhas mãos vinham muito ocupadas.

- Tu esqueceste o principal! Eu vou buscar ele.

E ele foi até o comandante e disse que havia esquecido de algo no barco e que iria buscar, mas não demoraria.

- Tinha que ser tu mesmo – falou-lhe o comandante irritado. – Vá lá!

E o jovem correu feito um maluco pelo trapiche, atravessou a rampa e entrou as carreiras dentro do barco detido, apanhou o isopor e voltou correndo.

- Cara – falou-lhe Álvares Rocha. – Tu és mais maluco do que eu.

Depois o barco apitou e desamarrou as cordas. Algumas pessoas do outro barco estavam junto à embarcação querendo também embarcar. Mas não podia embarcar mais ninguém.

A noite continuava limpa e serena. Belém ficava novamente para trás e Álvares e seu novo parceiro seguiam em direção ao Marajó.

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