segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Adeus, Isaías

O desgraçado estava liso. Tinha alguns trocados e comprou uma garrafa de 1,5 de vinho vagabundo. Estava tentando me agradar, pois na noite anterior havia me deixado igual um pateta na porta de uma maldita festa dizendo que ia providenciar uns ingressos. Eu só queria beber e o fodido queria dançar. Esperei até certo tempo. Voltei então para praça. A madrugada já ia alta e fazia um gostoso friozinho. Ótimo para tomar um coquetel. Depois disso voltei para casa, pois já estava dormindo sentado no bar e antes que dormisse na rua resolvi voltar.
Na manhã seguinte dei uma bela cagada na cabeça de Isaías. Disse que se eu tivesse o encontrado naquela noite teria lhe acertado uns bons foguetes na cara para ele deixar de ser otário. Meu pai, que estava próximo, me lançou um olhar reprovador. Meu pai era mole demais para me dar uma surra e além-o-mais eu já não era mais nem uma criança.
O barco havia acabado de chegar no porto de Boa Vista. Muitas pessoas aguardavam para embarcar e tive leve impressão que pelo menos 25% daquelas pessoas havia me reconhecido do bar do barco. Dava para ver isso na forma como elas olhavam pra Daniel e eu. Bebíamos do vinho comprado por Isaías algumas horas antes. Eu bebia praticamente sozinho, pois Daniel sentiu o estômago nos primeiros goles da bebida e Isaías se despedia de alguns parentes meus que nem eu ainda havia dirigido a palavra. Ele era um filho-da-puta mesmo. Um desmedido hipócrita, dissimulado boa praça. Mas no meu cu era que ele não enfiava. Não enfiava mesmo.
- Vocês são meus manos. – dirigiu-se a nós Isaías cheio de ginga. – Olha aquela menina não pára de me olhar.
Olhei fixamente na larga e morena face de Isaías e disse de forma seca e direta:
- Espero que você tenha aprendido a lição.
- Que lição? – perguntou surpreso.
- Que nós dois não damos certo. Tu não falas a mesma linguagem que eu. Tu não fazes parte de minha turma. Vá procurar a tua galera, o pessoal que te entenda. Afastas-te de mim. Pois somos muito diferentes.
Lá se foi Isaías sumindo dentro do barco. Lá se foi quase 10 anos de amizade. Daniel que observou toda a conversa, calado, perdia os seus olhos no barco que sumia rio acima. A garrafa já estava pela metade.

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